Amanhecer

Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão vivas com charlatanismo. E o amor em vez de dar exige. E quem gosta de nós quer que sejamos alguma coisa de que eles precisam. Mentir dá remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece. {…}E, se tento falar, sai um rugido de tristeza. Então não é cólera apenas? Não, é tristeza também“.

. Clarice Lispector in A Descoberta do Mundo.

Henry { Apenas um nome }

Imaginei por um momento um mundo sem Henry. E jurei que no dia que perder Henry, eu matarei minha vulnerabilidade, minha capacidade para o verdadeiro amor, meus sentimentos, com a devassidão mais frenética. Depois de Henry não quero mais amor. {…} Depois de não ver Henry por cinco dias por causa de mil obrigações, não pude suportar. Pedi a ele para se encontrar comigo durante uma hora entre dois compromissos. Conversamos por um momento, então fomos para um quarto do hotel mais próximo. Que necessidade profunda dele. Só quando estou em seus braços as coisas parecem direitas. Depois de uma hora com ele, pude continuar o meu dia, fazendo coisas que não quero fazer, vendo pessoas que não me interessam.

. Anais Nïn .

25.07 [07] – Dia Nacional do Escritor

 

Por Gabriel Perissè*

Para quem por acaso não sabe, 25 de julho foi definido como dia nacional do escritor por decreto governamental, em 1960, após o sucesso do I Festival do Escritor Brasileiro, organizado naquele ano pela União Brasileira de Escritores, por iniciativa de seu presidente, João Peregrino Júnior, e de seu vice-presidente, Jorge Amado.

Quem se dispõe a abrir um champagne pela data? E o que exatamente vamos comemorar?

A primeira pergunta me lembrou a célebre distinção que o crítico francês Roland Barthes fazia entre écrivant e écrivain .

O écrivant é o escrevente, é aquele que está preocupado em transmitir sua mensagem mediante a palavra, explicando explicitamente, ensinando educadamente. Ele tem uma idéia e quer transmiti-la. E vai transmiti-la sem maiores delongas. Pão pão, queijo queijo.

O escrevente quase não se preocupa com a forma. Na maioria dos casos, nunca se preocupa de forma alguma com a forma. Está concentrado na tarefa de colocar o seu pensamento dentro de um envelope e endereçá-lo corretamente. O envelope é o texto, o livro, o que for, base material apenas, veículo. O fundamental, para o escrevente, é que o leitor entenda o conteúdo, e ponto final. O envelope pode ser jogado fora depois.

Já o écrivain , o escritor propriamente dito (ou propriamente escrito), cuida do envelope com o máximo cuidado e estilo. E a carta vai, mesmo com o envelope vazio. Porque o vazio também diz muito. O envelope é a carta. As palavras e as idéias são uma só realidade literária.

O escritor convence graças ao poder de sua paixão pela palavra, e não prioritariamente pela paixão que dedique a uma causa. Ou melhor, a sua causa sempre foi e será a palavra, caminho e céu de todas as causas. E de todas as paixões.

O texto literário nasce das mãos do escritor. O texto do escrevente pode até conter alguns traços literários, mas são um recurso a mais para instrumentalizar melhor a palavra.

A rigor, os escreventes, os que escrevem para vencer, para convencer, para desenvolver teorias e ganhar adesões, deveriam comemorar seu dia em outra data. Talvez no dia do intelectual, ou no dia do retórico, ou no dia do autor de teses.

No dia do escritor comemoramos a solidão diante da palavra, a verdade, o medo, a alegria, o amor indizíveis de só saber escrever”

* Autor de “Ler, pensar e escrever” (Ed. Arte e Ciência) e “O leitor criativo” (Omega Editora)

Boa Sorte

Assisti o clip por acaso na TV a cabo dos meus pais, e achei a música, melodia e clip simples e belos:

♪ é só isso,
não tem mais jeito,
acabou,
boa sorte.
não tenho o que dizer,
são só palavras,
e o que eu sinto,
não mudará.

~ ♥ ~

tudo que quer me dar, (everything you want to give me)
é demais,
é pesado, (It’s over)
não há paz. (it’s heavy)
tudo o que quer de mim, (there’s no peace)
irreais, (all you want from me)
expectativas, (It’s surreal, the expectations)
desleais ♪

. Vanessa da Mata & Ben Harper .

Sombras…

E são sombras, sombras…“. Fernando Pessoa .

Amanheceu escuro. Chuva fina, céu com cor de solidão. Árvores levemente reclinadas recebendo a chuva, deixando o ar com sabor de coração despedaçado. Sombras arrastando-se embaixo de carros e pés, arrastando-se entre garagens, túneis, praças. Estátuas fieis ao lado de prédios imponentes. Luzes acesas, à falta completa da luz natural. Tristezas cintiliando ao vento. E no entanto, há céu azul dentro de mim. Azul resplandecente, sol brilhante, e grandes probabilidades de tempo bom por toda a semana.

Lyani }

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O Vento

No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas que o vento não conseguiu levar: um estribilho antigo, um carinho no momento preciso, o folhear de um livro de poemas, o cheiro que tinha um dia o próprio vento…”

. Mario Quintana .

Chorei

Chorei porque não era mais uma criança com a fé cega de criança. Chorei porque não podia mais acreditar e adoro acreditar. Chorei porque daqui em diante chorarei menos. Chorei porque perdi a minha dor e ainda não estou acostumada com a ausência dela.”

. Anaïs Nin .

Sentir

Não é preciso entender uma coisa para sentir. Quando a razão é capaz de entender o ocorrido, as feridas no coração já são profundas demais”

 . Carlos Ruiz Zafón in A Sombra do Vento .

Sugestão

Sede assim… qualquer coisa
serena, isenta, fiel.
Flor que se cumpre,
sem pergunta.
Onda que se esforça,
por exercício desinteressado.
Lua que envolve igualmente
os noivos abraçados
e os soldados já frios.
{…}
Sede assim, qualquer coisa,
serena, isenta, fiel.

Não como o resto dos homens.

. Cecília Meireles .