Saber viver

Em luta, meu ser se parte em dois. Um que foge, outro que aceita. O que aceita diz: não. Eu não quero pensar no que virá: quero pensar no que é. Agora. No que está sendo. Pensar no que ainda não veio é fugir, buscar apoio em coisas externas a mim, de cuja consistência não posso duvidar porque não a conheço. Pensar no que está sendo, ou antes, não, não pensar, mas enfrentar e penetrar no que está sendo é coragem. Pensar é ainda fuga: aprender subjetivamente a realidade de maneira a não assustar. Entrar nela significa viver .
Sôfrego, torno a anexar a mim esse monólogo rebelde, essa aceitação ingênua de quem não sabe que viver é, constantemente, construir, não derrubar. De quem não sabe que esse prolongado construir implica em erros, e saber viver implica em não valorizar esses erros, ou suavizá-los, distorcê-los ou mesmo eliminá-los para que o restante da construção não seja abalado”

. Caio Fernando Abreu in O Inventário do Ir-remediável .


3 comentários sobre “Saber viver

  1. De tanto ler esses trechos que você posta aqui comecei a pensar que lá nos meus anos de faculdade nos anos 80 (lindos anos) eu li Caio Fernando Abreu. Eu sabia que a qualquer hora, em alguma gaveta não muito usada, um livro dele ia surgir. E foi dito e feito. procurando esses dias umas fichas antigas numas gavetas no consultório me deparei com quem? com um velho, amarelado livro editado pela brasiliense: Morangos mofados. Estou relendo. E aqueles contos me parece ter poderes de máquina do tempo. Ah anos oitenta!

    Um beijo,

    Dauri

Deixe uma resposta para Dauri Batisti Cancelar resposta

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.