31.10 – 106º Aniversário de Drummond

{…}

Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?

{…}”

. Carlos Drummond de Andrade, A Procura da Poesia .

Luz e escuridão

XIV Desafio Incubadora Literária
Tema: Mulher
Período para votação: 29/10 a 31/10

 

“Verifico que, tantas vezes alegre,
tantas vezes contente, estou sempre triste”
Fernando Pessoa

Ela tenta, sabendo que vai falhar, esquecê-lo, enquanto colhe as flores para levar à mesa da casa de sua mãe. Não quer amá-lo, nem desejar a sua escuridão e o seu sorriso sombrio e gelado. Mas sempre que é primavera ele faz tanta falta! Suspira e respira o ar impregnado de flores, lembrando-se de onde estava e seus deveres.

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Pororoca

Uma das vantagens de trabalhar num Centro de Informações é estar sempre recebendo novidades do mundo editoral:  revistas novas, jornais de todos os estados, convites para eventos interessantes. O meu último achado foi uma publicação nova da Editora Mandioca, a Revista Pororoca do Amazonas que mostra ao mundo toda a riqueza desta região com muito charme, bom humor e criatividade. A revista é incrívelmente bonita e chama bastante atenção, sem contar que as matérias são ótimas, inclusive, uma que me chamou bastante atenção, foi o perfil e entrevista do autor Milton Hatoum me apresentado (e presenteado em livros) por Arquilau, um leitor querido aqui do “Entre Aspas“. Estou com dois livros do autor para ler, serão os próximos da minha lista. Fica a dica para leitura tanto da revista, como deste autor fantástico e brasileiro.

A Escrita é o desconhecido

A escrita é o desconhecido. Antes de escrever não sabemos nada acerca do que vamos escrever. Com toda a lucidez. É o desconhecido de nós mesmos, da nossa cabeça, do nosso corpo. Não é sequer uma reflexão, escrever é uma espécie de faculdade que temos ao lado da nossa pessoa, paralelamente a ela, de uma outra pessoa que aparece e que avança, invisível, dotada de pensamento, de cólera, e que, por vezes, pelos seus próprios factos, está em perigo de perder a vida. Se soubéssemos alguma coisa do que vamos escrever, antes de o fazer, antes de escrever, nunca escreveríamos. Não valeria a pena. Escrever é tentar saber aquilo que escreveríamos se escrevêssemos – só o sabemos depois – antes, é a interrogação mais perigosa que nos podemos fazer. Mas é também a mais corrente”

. Marguerite Duras in Escrever .

“Abre Aspas II”

Estou muito feliz de ter sido convidada pela Lunna à participar da Blogagem Coletiva “Abre Aspas II“:

Dia 27 de outubro “Abra Aspas” para a poesia no seu blog…

O objetivo é escolher uma poesia para postar nesta data e falar um pouco de seu autor para deixar a blogosfera mais poética e divulgar o trabalho de novos e brilhantes poetas.

Então, a minha escolha:

Anjo Ca’ido

Nada como beber vinho
numa sacada alta como esta
a beira da vertigem
meu corpo ganha asas
insuport’aveis…

O ‘ultimo cigarro apagou
antes de chegar ao fim
l’a embaixo

Ser’a que vai ser r’apido?

N’ao tem nem vento
a noite esta linda
as estrelas todas
est’ao no mesmo lugar
de sempre…

Vou tentar chegar naquela ali
a que tem menos brilho
quase apagada entre as outras

J’a fazem algumas noites
que tenho reparado nela
acho que n’ao tem nome

– pelo menos daqui
n’ao consigo ver direito.

Quem sabe de perto
as coisas mudem para melhor

Estou pensando em mudar
meu nome tamb’em
para que ningu’em possa me chamar
de volta

depois que as asas quebrarem…

. Marcos Caldo .

Não poderia falar de Marcos Caldo, sem mencionar Roberta, afinal foi ela que me apresentou o blog dele e suas lindíssimas palavras que me encantaram desde o primeiro momento. Continuo, infelizmente, sem poder contar muito dele pois não tive oportunidades de conhecê-lo, mesmo que seja apenas um pouco para formar sua breve biografia. Ainda assim, sei que é de tudo um pouco em relação à arte: pintor, músico, ator, poeta. Em seu espaço, sobre si, só palavras em forma de poesias. É muito e diz muito para quem sabe ler e para aqueles que, assim como eu, adoram esse mundo fantástico da poesia. Então, deixo aqui o convite para lê-lo e conhecê-lo através de suas lindas palavras.

Pela primeira vez em anos

I slur a plea for you to come home
But I know it’s too late
I should have given you a reason to stay

Death Cab for Cutie

 

Eu sei amor que as coisas não foram tão belas como imaginávamos.
Eu também sei que as diferenças deixaram vazios
Espaços de palavras que não foram ditas

Mas olha, eu guardei todas as suas cores mais preferidas
Aqui nessa caixa de madeira que você me deu com flores

À noite quando tudo está tão cinza
Eu vejo ela ali,
Em cima do gaveteiro onde nossas roupas se misturavam
Eu sorrio, porquê sei que você está aqui também
Em todas as suas cores

Cada uma me faz lembrar um sorriso
Uma tarde, um presente, um beijo
Todas me lembram você
Todo o espectro de cores possíveis

Só que ontem eu chorei
Chorei todas as lágrimas que engoli esperando você voltar

Eu abri a caixa de madeira
Precisei tocar as cores com a mão
Precisei muito de você

Estava vazia
Você se foi e levou todas as cores
Fiquei realmente só
Pela primeira vez em anos

{ Lyani } 23/10/2008

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Uma pena…

Recomecei a tremer no momento em que disparei de sua sala, perguntando-me se meu coração não poderia simplesmente parar na idade madura de 23 anos. O primeiro cigarro que acendi aterrissou diretamente no alto da minha nova Jimmy, onde, em vez de cair no cimento, fumegou o tempo suficiente para fazer um pequeno e definido furo. Ótimo, murmurei. Simplesmente do cacete. Mais pontos, arredondando meu total em quatro mil para a mercadoria arruinada hoje – um novo recorde pessoal. Talvez ela morra antes que eu volte, pensei, decidindo que estava na hora de olhar o lado bom. Talvez, só talvez, ela caísse de algo raro e exótico e todos seríamos libertados de seu manancial de tormento. Saboreei uma última tragada antes de apagar o cigarro e disse a mim mesma para ser racional. Você não quer que ela morra, pensei, espreguiçando-me no assento de trás. Porque se ela morre, você perde toda a esperança de matá-la você mesma. E isso seria uma pena

. Lauren Weisberger in O Diabo Veste Prada .