Segredo

Tenho vontade de chorar,
Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro…

Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo”

. Álvaro de Campos in Poemas .

Duas Vidas

Peguei emprestado daqui

{…}Temos todos duas vidas: 
A verdadeira, que é a que sonhamos na infância, 
E que continuamos sonhando, adultos, num substrato de névoa; 
A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros, 
Que é a prática, a útil, 
Aquela em que acabam por nos meter num caixão. 
 

Na outra não há caixões, nem mortes, 
Há só ilustrações de infância: 
Grandes livros coloridos, para ver mas não ler; 
Grandes páginas de cores para recordar mais tarde. 
Na outra somos nós, 
Na outra vivemos; 
Nesta morremos, que é o que viver quer dizer; 
Neste momento, pela náusea, vivo na outra… ”

Álvaro de Campos in Dactilografia .

Entrelinhas

─ “Sempre conservei uma aspa à esquerda e à direita de mim” ─ C. L. Sempre achei que aspas eram o “dito não dito” Mas quem sou eu pra questionar C.L?
─ Como assim?
─ Bem, pessoas aspas, geralmente agem como o que querem ser, mas ficam longe de quem são! Se vive entre aspas… vive metáforas… personagens.
─ Acho que é isso mesmo.
─ Surpresa minha, você escreve tão segura de si… Não acredito que sua personalidade seja tão diferente.
─ Engraçado você achar que escrevo tão segura de mim, quando acho que estou escrevendo toda a fragilidade do que há em mim.
─ As palavras são apenas a janela… Se aprender a ler, entenderá o que ter com a pessoa do outro lado. Sentimentos são traduzidos por palavras… Saudade, o que é? Sabemos o que a saudade significa, mas não o que é, então podemos escrever saudade de uma maneira nova, fazendo qualquer pessoa entender o que é, sem dizer a palavra saudade. Se eu escrever:

Eu acordei com saudade. Saudade é bom pra acordar com a gente. A gente levanta e deixa a saudade dormindo quietinha na cama, com medo dela assustar com o barulho do vento entrando pela janela. Eu queria aprender a descrever o que senti, aprendi e o quanto sou grato por ti. Queria não te perder assim, no espelho trincado, no parta retrato vazio, na aliança sem dedo, na gaveta ao lado de seu perfume preferido. Eu tenho medo de acordar a saudade, deixa ela lá, dormindo, hoje serei mais rico que o luar, aquele cúmplice de nossas caminhadas no calçadão a beira mar. Tenho tanta fá em mim, tão pouca crença em ti e uma insignificante esperança em nós.

─ Estou falando de alguém e da saudade, mas posso descrever a minha saudade simplesmente sem tocar na palavra.

Se eu tentar me distrair, vou brincar de recorta e cola com fotos suas. Vou pintar os seus cabelos de uma outra cor, vou te colocar peitões enormes, te fazer mais baixa, alta, gordinha e magra. Vou marcar o seu rostos com pintas, sardas e marquinhas de catapora, vou tatuar as suas costas, pés e ombros. Quem sabe eu até lhe faça negra, ruiva, morena, quem sabe eu explore cada cantinho do seu corpo em busca de algo que eu não adore, que não ame. Quem sabe um dia eu entenda onde e quando começou, a partir de quando você entrou aqui em mim!?A minha vontade de lhe ter hoje, é ainda maior que a de ontem.

─ Ainda cheira saudade?
─ E mais intenso…
─ É assim que leio você… Nas entrelinhas, no que não foi dito, mas no que pesava quando escreveu…
─ “Que se salvem as entrelinhas” C.L., era a frase anterior a esta que iniciou a conversa.

Conversa no Msn com w.Moscolini

Desafio: “Dias de Não”

Inspirado no meu post anterior, o Edu do Tudo, Menos Aquilo teve essa idéia maravilhosa de lançar um desafio aos blogueiros e visitantes para compartilhar o que possivelmente tenham escrito sobre os “Dias de Não”. 

Quem nunca teve um dia de NÃO? Hoje não quero sorrir, hoje não quero ir pro trabalho, hoje não quero esquecer, hoje não quero você, hoje não quero te perder, hoje não quero sofrer… Hoje, NÃO!

O Desafio está lançado!!!! (aqui no meu blog, pq segundo o Edu, passa tão pouca gente no blog dele que estas coisas nao dariam certo ¬¬’ Não acho que é bem assim, e se for, quem perde é quem não passa por lá… ) Participem com seus textos, poemas, palavras! Como foi, ou como está sendo o seu dia de Hoje, NÃO!?

E claro, começo o desafio com o Dia de Não do Edu:

“Hoje, não.
Hoje, eu não quero.

Hoje, eu não quero planejar
Hoje, eu não quero organizar
Hoje, eu não quero analisar
Hoje, eu não quero entender
Hoje, eu não quero pensar no amanhã
Hoje, eu não quero desconfiar
Hoje, eu não quero saber. Amanhã, sim.

Hoje, eu não sou responsável pelo amanhã
Hoje, eu não quero saber que não consegui
Hoje, eu não quero saber que não foi
Hoje, eu não quero saber que não dou conta
Hoje, eu não quero saber que não sou
Hoje, eu não vou. Amanhã, sim.

Hoje, eu não quero entender o fim
Hoje, eu não quero saber que passo
Hoje, eu não quero saber que não será
Hoje, eu não quero conseguir
Hoje, eu não quero ser útil
Hoje, eu não quero servir
Hoje, eu não quero adiantar
Hoje, eu não quero mais
Hoje, eu não quero me conformar. Amanhã, sim.

Hoje, eu não quero deixar passar
Hoje, eu não quero adiar o toque
Hoje, eu não quero flanar
Hoje, eu não quero dissimular
Hoje, eu não quero disfarçar
Hoje, não quero dividir
Hoje, eu não quero que hoje acabe
Hoje, eu não quero deixar para amanhã
Hoje, eu não quero menos. Amanhã, sim.

Hoje não
Hoje, eu não quero.
Hoje, eu não quero esquecer você. Amanhã, também não”

aqui, o meu Dia de Não! para quem quiser ler!

Participem ^^,

Hoje, não!

Roubei daqui

{…} mas hoje não…
Não, hoje nada; hoje não posso.
A persistência confusa da minha subjetividade objetiva,
O sono da minha vida real, intercalado,
O cansaço antecipado e infinito,
Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico…
Esta espécie de alma…
Só depois de amanhã…”

. Álvaro de Campos in Poemas .

Dá-me a tua mão

Dá-me a tua mão: Vou agora te contar como entrei no nexpressivo que sempre foi a minha busca cega e secreta. De como entrei naquilo que existe entre o número um e o número dois, de como vi a linha de mistério e fogo, e que é linha sub-reptícia. Entre duas notas de música existe uma nota, entre dois fatos existe um fato, entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam existe um intervalo de espaço, existe um sentir que é entre o sentir – nos interstícios da matéria primordial está a linha de mistério e fogo  que é a respiração do mundo,  e a respiração contínua do mundo é aquilo que ouvimos  e chamamos de silêncio

. Clarice Lispector in A Paixão Segundo G.H. .

O que são.

─ Acontece que você não está vendo o que todo mundo vê.
─ E agora? As coisa serão… Bonitas?
─ As coisas serão o que são. (A paciente abre os olhos depois que House tira-lhe a gaze) E então, como estou?
─ Você está triste.

Conversa entre Dr. House e Apple (paciente)
Episódio 2 – 5ª temporada de House M.D.

O Livro Vazio

O Amor é simplesmente o ridículo da Vida
. HM .

No centro da Sala Hexagonal da Biblioteca Nacional de Uqbar, há um labirinto. Sua saída leva a um jardim que se bifurca. À sua direita, uma sala de espelhos. À esquerda, uma estante de vidro.
Ali, em 24 de Agosto de 2099, encontrei um volume solitário com título esmaecido. Ilegível. Seu número de tombo N-0001. A única pista sobre seu autor, seu conteúdo, mais precisamente, sobre a falta de conteúdo era uma inscrição no frontispício, anotada pelo Bibliotecário-Cego, Francisco Isidoro:

Sentia mais alívio do que sucesso ao terminar mais um texto. Revisou. Guardou.
Chegara à marca de 168 páginas. Ao abrir para reler, a visão. Epifania do vazio. Nada havia escrito. Páginas, muitas delas, de nada. Procurou por algum defeito. Abriu o backup. No arquivo demiurgo, o mesmo nada. Não era vírus. Os demais arquivos seguiam intactos. Seu escrito, nada.
Escrevera um livro completo de nada. Enciclopédia da falta de assunto. Havia 44320 palavras lá. Nada escrito. Onipresente ausência de mensagem. 4209077 caracteres apareciam e juntos formavam um conjunto vazio. “Quanta gente por aí, fala, fala e não diz nada”. Ele havia se tornado a maior delas.
Certa vez, lembraram-lhe que “muitas palavras são ditas por que ainda não encontramos a única palavra que importa”. Então, escreveu mais e mais para encontrar a “tal palavra que importa”. Quanto mais escrevia, menos dizia. Não entendera. Não havia palavra que importasse. Nenhuma faltava. Toda palavra era sobra. Redundância do nada. Prolixidade da falta. Fastio do vazio. A palavra que importava era o silêncio. Calar das palavras que nada diziam.
Via agora. Ridículo. Sabia-se ridículo. Simplesmente Ridículo. Não! Complicadamente Ridículo. Pleonasmo do ridículo.
Tudo que escrevera era ridículo. Não. O Nada que escrevera que era ridículo. Só escrevera sobre nada. Toda palavra era bruma. Dissipada a névoa, nada existia. Decifrado o código, não havia mensagem. Máscara sem rosto. Garrafa de náufrago vazia.
Fechou o arquivo. Imprimiu, com as devidas capa e contracapa, as páginas de nada. Encadernou-as caprichosamente em brochuras transparentes. Arrumou um lugar na estante. Prateleira de escritos ridículos sobre o nada. Cheia. Registrou o número de tombo no arquivo da memória, na seção de sonhos esquecidos. Nas vizinhanças do setor dos rostos perdidos, dos nomes esquecidos. Dizem que lá segue devidamente depositada. Jaz em paz uma coletânea ridícula sobre o Nada.
O arquivo seguiu convertido e salvo. Ele, repetido e perdido na busca do Nada. Na falta de inteligência, resta seguir. Na falta do que dizer, repetir. Repeti-la. Repetir o Nada

Qualquer Um, Menos Aquele que Busca Aquela
do Tudo, Menos Aquilo