Memórias Empoeiradas

LI Desafio Incubadora Literária
Tema: Máquina Fotográfica

Havia poeira no ar, possível de ver através dos raios de sol que conseguiam transpassar a sujeira nas vidraças e lambiam o chão de madeira com tons de dourado. Cada vez que ela tirava uma caixa da estante, mais poeira subia pelo ambiente e a fazia espirrar enlouquecidamente. Mas ela tinha que continuar, enquanto ainda podia. Haviam se passado anos, e ela sabia que se as filhas descobrissem que tinha subido até o sótão atrás de um passado há muito esquecido, levaria um bronca daquelas. Mas não importava, porque sua busca valia a pena. Tirou outra caixa do lugar e quando abriu ficou paralisada. A mão a meio gesto do que ia fazer, a boca numa linha reta e a íris dos olhos dilatadas. Apenas um brilho tremulava nos olhos. Brilho este que escorreu pelos sulcos das bochechas que os anos haviam tolhido e parou no canto da boca deixando um gosto salgado de saudade. Com mãos trêmulas, saiu da imobilidade e pegou a máquina na mão. Sorriu, enquanto outras lágrimas corriam e pingavam na lente daquele simples objeto por onde as cenas mais bonitas de sua vida haviam sido capturadas e guardadas para a eternidade. Aquela máquina fotográfica fazia parte de sua história e não era justo que em seus últimos momentos ela ficasse ali, relegada ao pó. Por mais obsoleta que estivesse, queria-a ao seu lado. Amiga fiel, observadora atenta de momentos insubstituíveis.

{ Lyani }

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