Entre os cadáveres…

Os livros bombardearam seus ombros, braços, o rosto voltado para cima, um livro pousou, quase obediente, como uma pomba branca, em suas mãos, as asas trêmulas. À luz mortiça, oscilante, uma página pendeu aberta e era como uma pluma de neve, as palavras nela pintadas delicadamente. Em meio à correria e à fúria, Montag teve tempo apenas de ler uma linha, mas esta brilhou em sua mente durante o minuto seguinte, como se marcada a ferro em brasa. ‘O tempo adormece ao sol da tarde‘. Soltou o livro. Imediatamente, outro caiu em seus braços.
– Montag, por aqui!
A mão de Montag se fechou como uma boca, esmagando o livro com selvagem devoção, com descuidada insanidade, junto ao peito. Os homens lá em cima lançavam braçadas de revistas para o ar poeirento. Elas caíam como pássaros abatidos e a mulher permanecia ali embaixo, parada como uma garotinha, entre os cadáveres.

Ray Bradbury in Fahrenheit 451


Um comentário sobre “Entre os cadáveres…

Comente

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.