
Autora: Sayaka Murata
Editora: Estação Liberdade
Tradutora: Rita Kohl
Páginas: 152
Keiko Furukura é uma mulher de 36 anos um tanto fora do comum. Sem ambições
profissionais, ela também não sonha com o tradicional destino feminino de casar e ter filhos.
Não se prende nem aos papeis tradicionais de gênero, nem aos mais modernos. Essa dupla
recusa é o ponto a partir do qual se desenrola “Querida Konbini”, o livro que tornou a
escritora japonesa Sayaka Murata best-seller dentro e fora da sua terra natal.
A personagem principal não tem um relacionamento amoroso e trabalha há mais de 15
anos em uma “konbini”, uma espécie de loja de conveniência – o que é considerado um
emprego “sem futuro”. Sem jamais ter se adaptado às regras implícitas que regem a
convivência entre as pessoas, a protagonista encontrou na loja de conveniência que a
contratou um papel que consegue interpretar. É quase com alívio que ela relata o
treinamento como atendente: foi ensinada sobre o que deve fazer, o que deve dizer, sobre
como deve sorrir e se comportar.
Se trata, de diferentes formas, de um trabalho precário, pouco criativo e que rende apenas
um salário baixo, sem qualquer perspectiva de melhora. E todos veem problema nisso –
exceto a própria Keiko. A sua recusa aos dois principais caminhos da vida adulta não se
limita a causar estranhamento em quem convive com ela. Na verdade, as pessoas parecem
ter uma necessidade quase visceral de ela “mude de vida”.
Quando Keiko tenta atender às pressões externas entrando em um relacionamento, todos
parecem esquecer o desprezo que sentiam pelo novo namorado dela. Cercada por sorrisos,
elogios e votos de felicidade, Keiko aos poucos se dá conta de que “queremos o seu
melhor” muitas vezes significa “queremos que você não seja estranha”. É uma perspectiva
assustadora quando pensamos na reação que nós mesmos receberíamos se
resolvêssemos nos recusar tão radicalmente a fazer aquilo que esperam de nós.
E é daí que vem um dos maiores trunfos do livro: com sua capacidade de fazer o senso
comum se tornar estranho, Sayaka Murata nos empresta um novo olhar sobre o que nos
cerca. A autora retrata a irrelevância que as pessoas à volta da personagem principal dão
aos seus reais desejos e vontades. Para o círculo familiar e de amizades de Keiko, vale
muito mais a conformidade com as expectativas sociais do que a sua possível felicidade.
Embora exista uma crítica aos papéis sociais, na história de Sayaka Murata a recusa de
Keiko não chega a ter ares revolucionários: o livro é menos sobre a atitude da personagem
fazer alguma diferença no mundo e mais sobre a turbulência social causada por quem, sem
causar mal a ninguém, vive satisfeito sem se encaixar. E isso não é nem de longe um ponto
negativo! “Querida konbini” é uma ótima leitura para todos aqueles que gostam de se
surpreender.
Sobre a escritora
Sayaka Murata nasceu em 1979. Já venceu o Prêmio Gunzo para Novos Escritores e
também os prêmios Mishima Yukio, Noma e Akutagawa. “Querida konbini” foi seu primeiro
livro traduzido para o inglês – atualmente,o título já está disponível em mais de 30 idiomas.,
incluindo português
Autoria do post
Meu nome é Vitória, muito prazer! Trabalho na editora de recursos educativos Twinkl, sou apaixonada por literatura e nos últimos meses tenho me empenhado em conhecer escritoras que ainda não estavam no meu repertório. Por isso, ao longo dos próximos
meses, vou falar aqui no “Entre Aspas” sobre 5 livros escritos por mulheres que são ótimos
para conhecer a literatura japonesa contemporânea.
Muito obrigada pelo espaço, Evelyn.
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